O amor conjugal é encontro
Contou-me o João que o que mais o impressionara nos encontros de preparação para o Matrimónio foi a pergunta do assistente espiritual: “Morrias pela pessoa que amas?”
A reacções dos noivos nem sempre estavam em conformidade com o que eles próprios testemunhavam: estavam todos muito apaixonados, fariam tudo pela pessoa amada, mas morrer por ela… Lembrou-se dos seus pais. De facto, a vida deles era uma doação total um ao outro. Isto tornou-se extraordinariamente visível, quando o pai, certo dia, se colocou à frente dum touro em fúria que investira contra a sua mãe. Esteve largos meses hospitalizado. Esta recordação fê-lo entender a pergunta do assistente espiritual.
Amar alguém é, como escreveu Feliciano Blásquez, dizer-lhe “Tu não morrerás”. Ou seja, a tua vida para mim é tão importante que a minha só tem sentido se for tua. Antoine de Saint-Exupéry, em O Principezinho, a propósito duma flor, escreve frases fabulosos que se aplicam inteiramente a esta situação: “Se alguém gostar duma flor da qual existe apenas um único exemplar em milhões e milhões de estrelas, isso bastará para se sentir feliz quando as contempla. Diz para consigo: «A minha flor está lá, em qualquer parte…» mas se a ovelha come a flor, é como se, de súbito, todas as estrelas se apagassem”.
Em muitos tratados sobre o amor conjugal aparece um conceito, nos dias de hoje, muito esquecido: o amor não se tem, não se possui como um automóvel ou um computador. O amor dá-se. Esta é uma descoberta de tantos maridos e esposas: na medida em que me dou, em que faço da minha vida uma doação sem reservas à pessoa que amo, estou a criar nela um rio inesgotável de novas possibilidades.
O amor é essencialmente encontro: como aquele em que te vi pela primeira vez, em que o meu coração bateu sobressaltado. Este encontro, repetido em cada dia, mil vezes em cada ano, mas sempre novo, sempre como o primeiro, que me faz tremer as pernas, torna-me feliz. No fim de um dia de trabalho, estou ansioso por regressar a casa, ou encontrar-te na paragem do autocarro que nos há-de levar de regresso ao nosso lar.
Mas este nosso encontro, por mais romântico, por mais sincero, nem sempre é fácil. A vida está cheia de dificuldades. Estas são para vencer. Na medida em que o casal as vence, consolida o seu amor. Voltando ao Principezinho, apetece-me recordar a “guerra” entre as flores e as ovelhas… “Há milhões de anos que as flores fabricam espinhos. Há milhões de anos que, apesar disso, as ovelhas comem as flores. E não será uma coisa séria procurar compreender porque é que elas têm tanto trabalho para fabricar espinhos que não servem para nada?” As dificuldades só têm sentido se forem vencidas. Há milhões de anos que elas existem. Há milhões de anos que há sempre alguém que as vence.
Por António Jesus Cunha
In Voz Portucalense
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